terça-feira, 22 de maio de 2012

Vítor Belanciano e os Alabama Shakes

E pronto, o Vítor Belanciano apelidou os Alabama Shakes de «reaccionários». Antes de tentarmos perceber se os Alabama Shakes merecem este rótulo, o que é uma banda reaccionária? Na minha opinião (o quê, esperavam bibliografia, era?), ser reaccionário é, acima de tudo, recusar o presente. Nem acho que o reaccionarismo tenha de nascer por oposição do presente ao passado (sempre mitificado): o reaccionarismo é a recusa do presente, que, a posteriori, conduzirá a um desejo de regresso ao paraíso perdido. Num certo sentido, ser reaccionário não é muito diferente de ser vanguardista, na medida em que a vanguarda é também um desejo de rotura com o presente. E em ambos os casos a rotura é apenas uma ferramenta que serve para instaurar uma nova ordem, no caso do reaccionarismo uma nova ordem mascarada de velha ordem. Ou seja, o reaccionário é alguém deslocado do seu ambiente, julgando - erradamente - que está deslocado no tempo. O reaccionário sente-se certo no tempo errado, não percebendo que o que ele está é errado no tempo certo. Por isso, é-me muito difícil compreender que alguém apelide os Alabama Shakes de «banda reaccionária». A afirmação estética que os Alabama Shakes fazem não é tanto uma afirmação reaccionária como é uma afirmação nostálgica. Para o bem e para o mal, a cultura pop (não só a música) do arranque do século (do milénio!) decidiu ser nostálgica (o próprio Vítor Belanciano escreveu uma peça sobre o tema no Ípsilon de há algumas semanas). E não decidiu ser nostálgica baseada numa carta de intenções que alguém escreveu. Este desvio para a nostalgia (que abrange a totalidade do fascinante século XX, do Titanic aos anos 90) deu-se de um modo orgânico, sem um centro de decisão identificável, sem um objectivo estético concreto. Nem é, na minha opinião, uma tendência que precise da recusa do presente para ser justificada. Talvez seja um certo cansaço pela vanguarda, que trabalhou intensamente nas décadas de 60, 70 e 80; talvez seja apenas o reconhecimento que a vanguarda dessas décadas merece ser revisitada: a nostalgia é um sentimento amoroso, por oposição ao reaccionarismo, que é um sentimento bélico. É por isso que os Alabama Shakes não são uma banda reaccionária, como não são uma banda reaccionária os LCD Soundsystem, por exemplo, o os The Walkmen, bandas que também fazem aquilo que os Alabama Shakes fazem e de um modo muito mais consciente (os The Walkmen têm inclusivamente um manifesto publicado sobre os que podem e não podem fazer, indo ao pormenor de proibir, por exemplo, os tripés de guitarra ou equipamento construído depois de 1979). Há várias maneiras de olhar para o passado.