quinta-feira, 31 de agosto de 2006

Longe de Manaus*

Até se lhe perdoa esta coisa dos manuais escolares: o Origem das Espécies assinala um ano, e este blogue assinala com prazer o dito. Obrigado, Francisco.

*Este título de post, além de ser o segundo de hoje que leva asterisco, não faz sentido nenhum. Não há aqui nenhum trocadilho, nem seque uma alusãozita de segunda. Acontece que estou a lê-lo e apeteceu-me.

Este meu

(...) É verdade, meus queridos amigos. Fui muitas vezes esmagado pela visão que muito boa gente tem desta merda toda, mas nada que se compare a este meu, o Tolstoy. A partir de agora, em vez de ter opinião, vou apenas, na medida do possivel, e assim o Miguel Sousa Tavares ou a Ana Drago não provoquem, vou passar a apenas mostrar os resultados, como uma chave do Totobola. Um xis e dois. (...)

A verdade é que se o maradona escrevesse mais, este blogue passaria a ser um mero exercício de copy/paste, o que me facilitava muito a vida.

Ui*

Se o projecto está destinado a meter água, porque não chamá-lo de Sink Tanque?

*Esta doeu.

Estado S.A.

A razão pela qual eu sou um liberal e não um conservador é que não pretendo estender a dúvida para o campo político. A dúvida está lá como modo de vida (fico três semanas para escolher uma cadeira, três meses para desenhar umas escadas, três anos a tentar perceber o que quero fazer na vida, três vidas para perceber se Deus existe), e a tão desejada ambiguidade é o que me move. Mas quando toca à política alto lá e para o baile. Gosto dos gráficos, das certezas, da arrogância que os liberais têm ao ensinarem-nos a maneira liberal de estrelar um ovo. Dá-me segurança, penso, acreditar nos gráficos. Causa consequência, análise económica, racionalização, essas coisas todas. Politicamente, gosto delas, porque acredito que se conseguem atingir resultados, e acredito que é desejável que se atinjam resultados. Talvez pense assim porque não quero ser político, não quero participar no jogo. Quero apenas que uns senhores de gravata me resolvam os problemas para que eu possa continuar a dedicar-me com conforto às dúvidas que valem a pena. Há cinco frases escrevi que me dá segurança acreditar nos gráficos. Não usei o verbo acreditar por acaso: sei que se trata de uma fé como outra qualquer. Apesar de ser uma ideia bonita pensar o contrário, acho que quando se fala de filosofias políticas se fala mais em política e menos em filosofia. Os livros e as prosas são inspiradores, mas quando toca a decisões as coisas surgem na Rua de S. Caetano ou no Largo do Rato, onde a elevação de espírito não me parece estar muito presente. Esta é talvez a minha costela conservadora: a descrença e o pessimismo, a falta de ideais salvíficos. Por isso é que eu recorro à brigada da equação: nos números e nas tabelas sobra pouco espaço para a retórica.

A dúvida existencial é demasiado bela para ser conspurcada pelos aparelhos partidários (ainda que eu não cometa a imprudência de considerar que a política se reduz aos caciques.) Ser liberal ou conservador é, afinal, apenas uma questão política, e isso não interessa assim tanto.

terça-feira, 29 de agosto de 2006

Pôncio

Acabo de saber, através do O Dia Seguinte, programa futeboleiro na Sic Noticias sem interesse absolutamente nenhum, encabeçado por David Borges, destruído por Fernando Seara, adormecido pelo o gajo de bigode do Porto, e salvo por Dias Ferreira, que Pôncio Monteiro está no hospital em estado grave. Não tenho mais informações porque só consulto sites estrangeiros, que não se interessam pelo Pôncio Monteiro.

Não sei se alguma vez tiveram o privilegio de assistir a alguma das execuções sumárias de Pôncio Monteiro a algum árbitro que só tenha beneficiado o Porto em seis penaltis inexistentes e três jogadores mal expulsos para o adversário. Pôncio Monteiro tem uma memória tão wikipediana e uma inteligência tão finamente afinada para a defesa das cores portistas que mesmo Pinto da Costa, Pôncio querendo, poderia passar inequivocamente por espião do Benfica.

Esta sua soberba, e por enquanto inigualável, capacidade para estruturar factos remotamente interligados por forma a mascarar a mais evidente das evidências, por si só, faria de Pôncio Monteiro o melhor de todos. Mas ele, nas suas, sempre escassos e curtas, aparições, não criou apenas magníficos romances que no fim revelavam sempre manadas de cavalos de Troia cheios de estádios da Luz carregadinhos de benfiquistas dentro das nossas orelhas.

Para além disso, como bónus, acresce que é tudo isto é servido com um escandaloso sentido de humor, uma ironia e um sarcasmo que, como diz a matemática, só pode estar ao alcance de uma pessoa que é melhor que as outras e para quem, portanto, a Carta Universal dos Direitos dos Homens faz, de facto, uma grande injustiça ao equivale-lo à escumalha restante.

Que recupere.

maradona

A minha ignorância é avassaladora




Lyonel Feininger, american-born german cubist / expressionist painter (notar como adiro a cada uma destas palavras), pintor que fez o obséquio de se manter desconhecido à minha pessoa, até ao dia de hoje. Há um extremo bom gosto nestas obras, que aparecem sem pretensão. As formas limam-se num esforço de abstracção que se quer incompleto, para que não se abra lugar à interpretação. Sim, isto é bastante mais «cubista» que «expressionista», mas um cubismo talvez naïf, pré-cubista em consciência, que deve mais a Cézanne do que a Picasso e Braques. Não há nada aqui que surpreenda ou inove, mas tudo é admiravelmente harmonioso, o que revela uma matéria muito sabida e muito bem aplicada. Aqui, as formas são elas mesmas, apenas ligeiramente deformadas, quase a régua e esquadro, num gesto muito caro à arquitectura. Talvez não seja por acaso que Feininger tenha sido uma pedra importante na Bauhaus de Gropius, e percebe-se (por estas obras, por exemplo) a vocação pedagógica deste homem. Infelizmente a História (de arte), na busca científica da síntese, acaba por deixar para as notas de rodapé aquilo que não é essencial, como este professor Feininger. Podia ficar aqui a noite toda a colar obras do tipo. Acreditem. Já ganhei o dia.



(Acabei de descobrir que esta imagem é um pormenor de uma obra. Quero lá saber. Este tipo resiste até à descontextualização. Deve ser isto que a Susan Sontag queria.)

segunda-feira, 28 de agosto de 2006

Da eficácia

Apesar de nunca ter ido à Suécia, apesar de não conhecer quase nada da Suécia, apesar de provavelmente não gostar da Suécia, às vezes apetecia-me que Portugal fosse um bocadinho mais parecido com a Suécia.

sexta-feira, 25 de agosto de 2006

Plutão

Anda toda a gente a fazer trocadilhos com Plutão (guilty as charged). Uns bons, outros maus, outros previsíveis (guilty as charged). Mas a taça vai, direitinha, para o Filipe Nunes Vicente:

CÁ PARA MIM:
Plutão foi mas é apanhado a fumar.

Lisboa

(...) O principal museu de Lisboa, situado numa zona nobre da cidade, parece implantado numa superfície lunar. Nas redondezas não há um café, uma esplanada, um restaurante, um quiosque de jornais e revistas, uma praça de táxis. Há só um passeio com 70cm de largura, um fontanário seco cuja brancura fere a vista, e as portas fechadas de meia dúzia de bares que abrem à meia-noite. O olhar perdido dos turistas diz tudo.

Eduardo Pitta, no Da Literatura

quinta-feira, 24 de agosto de 2006

terça-feira, 22 de agosto de 2006

Britpop

A reboque da entrevista abaixo mencionada, aproveito para recomendar mais um programa com o carimbo da BBC: architecture on 3, e os mui recomendáveis arquivos.

Grande Tusa

You see what's interesting is that in quite a lot of the writing about you, people say, well the thing about Piano is that he avoids theory, he avoids intellectualisation, indeed he's almost anti-intellectual. But from what you're saying - and I know we're not talking about theory - but what you're saying is not anti-intellectual. Now was there one particular period in your life you think that you deliberately almost fostered an image of excessive practicality?

Yes, of course, because, because you, first because you change. And being the son of a builder I enjoyed, in a quite snob way in some ways, to be a son of a builder, especially in an environment where sometimes architects been played a bit too much the artistic role.

Excerto de uma entrevista de Renzo Piano a John Tusa. Oiçam-na, esqueçam o transcript. Acabo de me aperceber que para entendermos realmente a obra de Renzo Piano, para conseguirmos sentir o seu espírito verdadeiramente, para vermos muitas das nossas dúvidas respondidas, temos necessariamente de o ouvir falar inglês. Impagável.

Os arquivos deste John Tusa têm que se lhe diga. Carlos Vaz Marques, step aside, please.

Quando toca aos clássicos sou de clichés

A abertura da Carmen, de Georges Bizet. Por exemplo. Agora mesmo, na Antena 2, ouvida no carro. Ah.

Globalização, procura-se

Com tanto chinês em Portugal, será que não há nenhum que tenha um primo que me arranje as referidas cadeiras a um preço de amigo? Wang? Li? Pong? Alguém?

sexta-feira, 18 de agosto de 2006

Notem que nós queremos a versão «creme»

Acabei de receber um e-mail que me acusa de ter mau gosto em cadeiras.

quinta-feira, 17 de agosto de 2006

Projecto de execução



Passo os dias a desenhar armários. Projecto de execução. Passo as noites a escolher cadeiras. Projecto de habitação.

Na imagem: Barcelona Chair, de Mies van der Rohe. Andamos à procura de imitações baratas. Contacatar para o e-mail acima. Obrigado.

sábado, 12 de agosto de 2006

Livre arbítrio

Conheço pessoas que acreditam em Deus. Não sei se diria «acreditam», talvez seja mais algo do campo do «saber», e não do «acreditar». São pessoas que sabem que Deus existe e, mais do que isso, sabem que Deus as ama. São profundamente religiosas, e de beatice não têm nada. Não rezam para que lhes passe a constipação, não rezam para serem aumentadas, não condenam os pecadores, não são moralistas. Mas evangelizam, através daquilo que são. Só posso imaginar que seja tranquilizador conhecer Deus, e saber que ele nos é exterior, uma entidade autónoma que não depende de nós para existir. Não sou assim, apesar de ser cristão. Deus é para mim algo que só faz sentido (e tem de fazer sentido, o que me separa desde logo dos meus amigos crentes) se for incompreensível. Um mistério, usando terminologia bastante canónica. Se eu acredito que há algo que não se pode reduzir a electrões e protões, só me consola a ideia de que me será sempre negada a hipótese de a conhecer. Não desisto de tentar, e é a isso que chamo teologia. E é por isso que a teologia me interessa tanto, porque se apresenta como a tentativa de atingir o inatingível. Algo que nos faz, ainda que apenas por brevíssimos momentos, acreditar que estamos perto de compreender Deus. Uma desesperada tentatica de superarmos a nossa escala. Não sei se Deus existe, e não me inquieta a hipótese da resposta ser negativa. É essa dúvida que me faz correr. É no constante confronto entre o absoluto abstracto que é a perfeição divina e a imperfeição exasperante da espécie humana que encontro as minhas bases para entender a vida de Cristo, e fazer dela uma religião. Entendo que para acreditarmos em Deus teremos que acreditar na infinidade da dúvida, na permanente existência do conflito humano com o desejo de salvação divina, até ao fim dos tempos. O que nos impede de tornar esta questão em algo puramente académico são os relatos dos evangelistas sobre o homem que não conseguimos censurar. Uma vez a Clara Ferreira Alves, a propósito de uma edição comentada da Bíblia (acho), disse que mais espantoso do que atribuirmos autoria divina àquele conjunto de livros, é imaginarmos que a Bíblia é puramente obra humana. Não podemos acreditar que o Homem é capaz de criar aquela história. Acho a ideia bonita, mas não concordo. Não há nada mais espantoso do que equacionar a existência de Deus. É a dúvida última. Isto não acaba com a nossa morte. O paraíso não é um conceito idílico. O livre arbítrio, esse, é o penoso caminho que julgamos ser do nosso interesse. O preço a pagar.

Copo meio cheio

O emigrante sai do seu país para sempre retornar nas férias. Aquele que fica atura a choldra mas sai sempre nas férias. Não sei quem fica a ganhar.

quinta-feira, 10 de agosto de 2006

Lisboa está a ficar pequena demais

Já é difícil andar de metro sem reconhecer alguma cara. De manhã, à tarde, está lá sempre alguém que já lá esteve as vezes suficientes para ser recordado. Pensam o mesmo de mim, certamente. O anonimato, aos poucos, vai-se perdendo, e com ele o escudo urbano por excelência. Se isto continua assim, mudo-me para o campo. Ao menos é mais fresquinho.

Aos grandes homens exigem-se momentos de grande sacrifício e entrega

«Mapa de armários».

Hackmeter

Agora foi o Francisco José Viegas. Depois do Abrupto, a pirataria vai fazendo a sua história, e já se tornou no novo critério de peso na blogosfera. Blogue que é blogue, é valandizado.

(Obviamente, ninguém me vai atacar. Mas eu simulo, que vocês nem dão por nada. Ah, a fama.)

PUB

O Melancómico está de volta. Voltou com com um post tão bom que até parece que se matou só para poder ressuscitar.

segunda-feira, 7 de agosto de 2006

Our own Route 66



Como nos disse um senhor lá no alto do Gerês, «é pegar aí essa routezinha nova». De realçar também a barriga de atum grelhada comida em terras de Santa Luzia, Tavira.