quinta-feira, 30 de junho de 2005

Fernando Guerra vê

Absolutamente imprescindível: Últimas Reportagens, obra recente de Fernando Guerra. Não só pela qualidade do trabalho fotográfico mas também pela extraodinária selecção de obras. Estou, como dizia o outro no anúncio, maravilhado.

Obrigado, Daniel, pela descoberta.

Notícia de última hora

Há professores na Faculdade de Arquitectura que são de esquerda, que querem levar os alunos à Cova da Moura «para acabar com os mal entendidos» e que defendem que «(m)uitas vezes são os jovens filhos de pais de classe média-alta e alta que causam conflitos, ao contrário do que se ouve por aí». Estou surpreendidíssimo.

Faz sentido, enquadra-se facilmente numa teoria coerente, que a arquitectura seja de esquerda. O medo do liberalismo e a paixão pela coisa pública explicam uma parte, o horror ao conservadorismo e a arrebatadora paixão pela vanguarda e experimentação explicam a outra. Claro, discordo. É um preconceito, gravíssimo. A arquitectura é provavelmente das áreas profissionais (e até artísticas) onde a esquerda mais prevalece, sobretudo ao nível da produção intelectual e académica. Assim de repente só me ocorre um nome da história da arquitectura portuguesa do século XX que sempre se situou à direita: Fernando Távora. O resto varia entre a anarquia a ala esquerda do PS. É assim.

quarta-feira, 29 de junho de 2005

É sim senhor

À entrada para o teatro o simpático porteiro perguntou-me: «É para a cultura, estúpido?»

Dois regressos

Dois regressos: o Pedro reactivou o seu Feias Artes, e o André inaugurou o seu Bons Ventos que, como o nome indica, é sobre meteorologia. Não é nada, é mesmo sobre a vida de arquitecto estagiário na capital de Espanha. Não é nada, quer dizer, o melhor é ir lá e conferir. O Pedro volta especialmente inspirado: recomendo vivamente o post Mário Soares, Bocage e João César das Neves.

Are you just happy to see me?

A plotter cá do atelier masturba-se ocasionalmente. A cabeça dos tinteiros põe-se, sem que ninguém lhe diga nada, a andar para a frente e para trás, durante uns momentos, coisa para uns centímetros apenas. Deve ser por isso que tem um vinco no rolo de papel. Tem mesmo. Cabrão, está a dar-me cabo dos desenhos. Mas pelo menos o papel tem saído sempre branco como uma virgem. Lá limpinha ela é.

Sonhando acordado com locais distantes 40

A inefável cadência, em todos os sentidos, que se reconhece ausente com alguma violência.

O melhor comentário de sempre (ou a crítica de arquitectura no seu melhor)

Lembro um post ali em baixo onde citava Ana Vaz Milheiro, a propósito do novo Centro Cultural do Cartaxo:

(...) Sente-se a presença, quer de Manuel Vicente, com quem Diogo Burnay colaborou em Macau, quer da iraniana Zaha Hadid, em cujo escritório londrino Cristina Veríssimo trabalhou. No Cartaxo convocam-se estas duas personagens tutelares. Retoma-se a tendência pós-moderna de Vicente na identidade performativa dos espaços e, de Hadid, explora-se o uso acentuado de geometrias menos "puras". (...)

E agora, sem mais delongas, hei-lo:

Como é que a influência da Zaha Hadid se sente se o período em que o projecto foi desenvolvido foi o período em que a Cristina Veríssimo esteve a fazer o mestrado em Harvard?...

Infelizmente o comentário não está assinado.

terça-feira, 28 de junho de 2005

Follow the leader

Nas discussões entre católicos chega sempre e inevitavelmente o momento em que alguém excumunga o seu interlocutor. Perante a impossibilidade de ambas as perspectivas serem admissíveis, aquele que defende a situação mais parecida com o discurso oficial da hierarquia dá a conversa por terminada invocando ser apenas porta-voz daquilo que é certo e que está escrito. Já aconteceu comigo várias vezes. Na base desta intolerância está um ressentimento de quem não consegue moldar a sociedade à sua imagem e precisa de sentir um grupo unido, dê por onde der, para enfrentar o exterior agressivo. E por isso é que os membros da própria classe, os próprios católicos, são muitas vezes o alvo escolhido (ver o exemplo do anúncio público do padre Serras Pereira onde ameaçava recusar a comunhão aos católicos que estivessem em pecado, no caso pecados relativos ao comportamento sexual dos fiéis). Aqueles que escolhem ser absolutamente seguidores das tomadas de posição do Vaticano não admitem outro modo de estar na Igreja que não seja esse, que de certa maneira é uma atitude de combate. Sentem-se traídos por quem partilha a sua fé mas não comunga das suas opções morais, especialmente na área sexual. A dinâmica de grupo tem aqui um papel muito forte. Como em qualquer grupo minoritário tem de existir um elemento agregador que represente uma dimensão sobre-humana capaz de transformar a falta de número em força. Nos católicos mais fundamentalistas essa figura tem sido, não Cristo, mas o Papa. Por uma razão muito simples: as palavras de Jesus são demasiado ambíguas (as parábolas) para servirem de arma de arremesso, enquanto que as cartas e encíclicas papais são bastante mais normativas. Por isso é que «os teológos e mesmo os santos andam a discutir tudo e mais alguma coisa (por vezes com grande violência) há vinte séculos». Foi este ambiente que se tem vindo a gerar dentro da Igreja Católica (e aqui não falo no Vaticano) que fez com que muitos ficassem desiludidos (incluindo eu) com a eleição de Ratzinger, ele que foi durante as duas últimas décadas a principal origem de uma moral dura e conservadora («exigente», nas palavras de quem a segue) estruturada num conjunto de textos muito coerentes. Acima de tudo foi um sinal, uma orientação, uma vitória daqueles que formam a task force mais purista. É por isso que ando angustiado, angústia essa que não pode durar muito tempo.

O que eu quis dizer é que César das Neves não está sozinho. Longe disso.

Um escape, hein?

Desde que o Francisco José Viegas se pôs a ler Paulo Coelho o Aviz apresenta uma taxa de postação muito acima do normal. Quase desesperada, diria.

Mãe, estou na blogosfera

Ver o Pedro Mexia escrever um longo texto usando as palavras que gostávamos de ter escrito sobre César das Neves e a relação entre o catolicismo e a sexualidade, é motivo de satisfação que baste. Agora ver o texto ser-nos dedicado é algo que entra no capítulo do surreal. Obrigado Pedro.

(Como é que era? «O nosso ego passou a corpo celeste». Sim, é isso.)

segunda-feira, 27 de junho de 2005

João César das Neves

(...) A opressão actual da condição feminina é fácil de demonstrar. Quais as principais vítimas da degradação da família? Da liberalização do aborto? Da banalização da pornografia? Objectivamente, a nossa cultura de ambição, violência e competição é, em múltiplos aspectos, diametralmente oposta aos valores femininos. A mulher foi influente em épocas que preferiam a honra ao sucesso, a estabilidade ao progresso, a beleza à eficácia, a tradição à novidade. (...)

A liberdade que mata a liberdade, in DN

Realmente esta sociedade que valoriza o sucesso, o progresso, a eficácia e a novidade só pode estar perdida.

Mrs. Smith

Fui ao cinema ver o Mrs. Smith, um filme com boas piadas mas com tiros a mais. É a história dos problemas que uma mulher tem no seu casamento por ser assassina profissional e não poder contar isso ao marido. A Mrs. Smith, que dá o nome ao filme, aparece vestida de várias maneiras diferentes ao longo do filme, o que faz cair por terra aquela ideia de que os filmes americanos de acção são «todos iguais». Dá também toda uma nova dimensão à expressão «dar uma passa», imortalizada recentemente por Artur Albarran. Reparem como nem a menção ao nome «Artur Albarran» faz desaparecer toda a carga erótica que perpassa por estas linhas. Sim, porque a Mrs. Smith é Angelina Jolie. Só estou para perceber como é que eles apagam as tatuagens...

P.S: O rapazote que faz o papel de marido não me é nada estranho. Tenho a impressão de já o ter visto num sítio qualquer. Já sei! É aquele tipo dos óculos retro que está ao lado do Gehry e da Zaha Hadid (e doutro tipo qualquer, esse não sei mesmo quem é). Ah memória que nunca falhas...

Sonhando acordado com locais distantes 39

À distância perde-se muito tempo a explicar minudências do discurso. O diz que disse, diz que não disse, não era isso, era aquilo. Coisas que as palavras atrapalham. Revelam-se absolutamente incapazes para cumprir a singela tarefa de ser transporte de uma mensagem. Como num ciclo viciado o significante passa a significado, e vice-versa. Já ninguém sabe onde nasceu a erva-daninha que está a emperrar a máquina. Dá vontade de mandar as palavras à merda e substitui-las por outros meios de comunicação. Mas, como disse aqui em baixo, sou um rapaz com pudor, logo deixo à vossa imaginação a descoberta desses «outros meios de comunicação». Não que seja preciso uma imaginação muito fértil, claro está.

Sonhando acordado com locais distantes 38

Não tivesse eu pudor e fazia disto uma rúbrica ilustrada. Vontade não me falta. Como um templo.

domingo, 26 de junho de 2005

Rititi, diga lá outra vez

Gostei de ver a Rititi no programa do Francisco, ontem. A moça (cá está, o português antigo) tem graça e é muito divertida. Guardei um momento especial: quando a Rititi falou das suas opções políticas. O Francisco lançou-lhe a questão dizendo que era algo estranho que esta personagem, a Rititi, esta mulher moderna exilidada em Madrid, esta mulher aberta a tudo, se dissesse de direita. A resposta, que aqui cito fazendo uso da minha memória débil, não andou longe disto:

Pois é. Acho que eu sempre quis ser de esquerda mas não consigo. A esquerda está demasiado chata, demasiado mole. Quer resolver tudo com paz e amor, como a intervenção de Zapatero na ONU sobre a questão do terrorismo, em que falou do «encontro de civilizações». Francamente, há que ter o mínimo de sentido de estado! Acho que devia fundar um partido só meu, onde tudo fosse permitido.

Lá nos encontraremos, disse prontamente o Francisco. Daqui revelo que também estou pronto para assinar onde for preciso.

Sonhando acordado (mais ou menos, a hora vai adiantada) com locais distantes 37

As datas dizem-se contadas cientificamente, baseadas lá nisso que é a órbita da terra à volta do sol e as piruetas diárias que vai dando sem falhas. Não tenho razão para duvidar, desde que nasci que o sol nasce sempre depois de se pôr, no mesmo sítio, à mesma hora. Sempre achei graça aos anos bissextos, esses que servem para acertar as nossas contas pelas do sistema solar. Assim aprendemos a confiar nos calendários como coisas dignas e respeitáveis. Eis senão quando o edifício vem abaixo. Afinal parece que isto pode já não ser verdade. Espanto. A gerência ficaria eternamente agradecida. Eternamente, podem conferir, é só uma questão de ir verificando regularmente o calendário.

Sonhando acordado com locais distantes 36

Hã?

sábado, 25 de junho de 2005

Está tudo bêbado (menos o Dinis, claro, que não bebe)



Para além disto o Expresso traz também duas garrafitas de Martini (é verdade). É desta, meus amigos, que vamos perceber os editoriais do Saraiva.

sexta-feira, 24 de junho de 2005

Bom Álvaro



O problema com os fenómenos de popularidade é que às vezes se torna difícil distinguir entre os bons e os menos bons. O culto torna-se sempre irracional e os cépticos aproveitam para lançar os seus canhões. Experiência própria. Fica aqui o meu agradecimento a este senhor que, cada dia que passa, me vai ensinando mais coisas. Nunca vi uma planta sua duas vezes da mesma maneira. Há sempre algo que se descobre, que se aprende. É um verdadeiro milagre (bastante extenuante, no entanto) descobrir a incrível complexidade que desenha a simplicidade aparente das obras do Siza. Não dá para copiar. É isso que o torna um dos grandes, é inimitável. Este merece idolatrado. Mais ainda quando a cena internacional anda entretida a premiar e a divulgar esses aí, os do costume, os tortos e dinâmicos, os conceptuais e fracturantes, os de palavra fácil e discurso sedutor. Bom Álvaro, que sempre perseguiu e conseguiu desenhar espaços de suporte da vida humana.

«Ora uma iniciativa privada pode ter o mesmo efeito positivo no bem-estar geral que uma iniciativa pública.»

Cuidado, ela começou a argumentar.

O tema interessa-me muito e concordo com o que ali está escrito. Acho que esta nota se impõe.

Ah granda Tony

(...) Blair não ficará surpreendido se muitos dos seus parceiros no continente europeu, nomeadamente a França e a Alemanha, olharem para este cenário com alguma desconfiança, perante reticências à política britânica, vista, em muitas capitais, como excessivamente dominada pelas regras do mercado. O chefe do Governo britânico procurou afastar essa percepção, com interrogações sobre o modelo social europeu "Que modelo social é este que tem 20 milhões de desempregados na Europa, em que as taxas de produtividade ficam atrás das dos Estados Unidos, que deixa que a Índia produza mais licenciados em ciência?" Blair também sublinhou que a tecnologia da informação, patentes, investigação e desenvolvimento e formação estão a descer neste continente, e que, das 20 principais universidades do mundo, hoje, apenas duas estão na Europa". Como corolário destas constatações, considerou: "Precisamos de uma Europa social. Mas, de uma Europa social que funcione." (...)

Blair propõe 'terceira via' para a União Europeia, in DN

Sonhando acordado com locais distantes 35

Mentira. Desde que o outro tipo disse que tudo é relativo que posso afirmar que a distância é fictícia. Mas outro outro veio depois dizer que era preciso combater os relativismos modernos (certamente um lapso, o que deveria ter dito era que era preciso combater os relativismos pós-modernos, certamente um lapso, como digo) e eu fiquei lixado. É que se for medir em termos absolutos dá-me já aqui uma depressão, e isso agora não me dá jeito nenhum porque inclusivamente tenho de ir ali fazer uma maquete. Ou maqueta, as opiniões divergem.

quinta-feira, 23 de junho de 2005

O blogue do Miguel, do Ricardo, do Tiago e do Zé Diogo

OLHA EU

Durante os últimos cinco anos, boa parte da minha vida profissional foi passada a escrever textos humorísticos para Herman José. Fiz boas piadas (a modéstia é para os vaidosos). Também fiz más piadas, inevitavelmente. Nunca apareci na televisão, nem por um motivo nem por outro. Depois do Herman ter sido intimado a prestar declarações no âmbito do processo Casa Pia, a SIC fez uma reportagem sobre isso. Lá apareço eu, quatro ou cinco vezes, ao lado do artista, numa gravação das crónicas da rádio. Deus, se existe, está a gozar comigo. E tem graça, o velhote.

(27/05/2003) RAP

Gato Fedorento, O Blog - pag. 206

Ando a ler o livro do Gato Fedorento. Fica a nostalgia do tempo em que tinha de dar muitas piruetas para tentar explicar a quem quer que fosse quem era o Ricardo Araújo Pereira. Fica, também, a sensação de que o blogue foi engolido pelo programa de televisão. Excelente, diga-se, nenhum reparo. Mas o blogue corre o risco de se tornar apenas num fenómeno que serviu de rampa de lançamento para outras coisas, o que é uma enorme injustiça. O Gato Fedorento foi um dos melhores blogues portugueses, na altura certa, e não apenas pelo humor mas principalmente pela qualidade da escrita (nem sempre de orientação marcadamente humorística). Lembro-me do Pedro Mexia ter escrito, em tempos, sobre a sensação de ciúme que o invade sempre que um artista semi-oculto por si admirado é descoberto pelo grande público. Reconheço que o sucesso massivo do Gato Fedorento me causa um sentimento parecido, mas o que me leva a escrever isto é saber que o melhor humor que estes tipos fazem não se oferece a toda a gente. Ou seja, mesmo depois do seu sucesso, Portugal continua rir-se dos Malucos do Riso como se nada fosse. Isto, meus amigos, é que é o atraso estrutural.

Tiago, toma lá um alçado



Pela primeira vez (e ao fim de algumas semanas com o trabalho a pairar por aí) lá me dignei a ensaiar este alçado. Não sei fazer alçados, não tenho o dom do olho que tudo equaciona e que acerta na dimensão do vão. Não sei o que isto vai dar, mas por enquanto agrada-me. Não passam ainda de riscos inconsequentes. Pelo que vale, eu gostava de habitar isto. E o cliente, onde vai encontrar espaço para desenhar a sua barra amarela? E o rústico, e a pedra antiga, e o tradicional, e...? O terreno, como se vê, não dá para isso, e será por aí que a argumentação tentará ir. Adivinham-se tempos difíceis.

quarta-feira, 22 de junho de 2005

Pára de me consumir, que tu abusas


Não me consumas
Não me consumas mais
Pára de me consumir
Que tu abusas
Sempre cada vez mais
Não é fácil digerir
Pára de me consumir

Moradia em Alenquer, estudo + Não me consumas, António Variações/Humanos

Questões de saúde

Jorge Sampaio veio acusar a Banca de não arriscar. Isto uma semana depois de ter condecorado Fátima Campos Ferreira* no 10 de Junho. Isto uma semana depois de ter recomendado que os jornalistas respondessem a Alberto João Jardim «como pudessem». Isto uma semana depois de... Pá, onde é que anda aquela malta que passou anos e anos a pedir a abdicação de João Paulo II quando precisamos deles?

*Com esta não é possível não dar razão ao Saraiva.

Sonhando acordado com locais distantes 34

Acho que devem por um piercing, ou lá o que é.

Antes do Degelo, Agustina Bessa-Luís

Sempre que o maradona escreve coisas destas, peço desculpa, mas tenho que partilhar

Está de volta a melhor escrita hiperbólica* da blogosfera (ainda que com uma taxa de incidência de erros ortográficos bem acima do tolerável, sem bem que são maioritariamente erros de acentuação, nomeadamente falta dela, como em «interminavel», « insensiveis», ou «poderosissimos», só para dar pequenos exemplos, coisa que se perdoa pois trata-se do maradona, e perdoa-se mesmo, não pratico ironia nestas linhas, perdoa-se mesmo, aliás, nem se nota).

*Como sabeis é também a escrita mais volátil da blogosfera. Como para copy/pastes não tenho pachorra (poderia ter escrito «paciência», mas «pachorra» parece-me mais snob e neste contexto acho que estou a tentar ser snob) o melhor é irem lá enquanto é tempo.

terça-feira, 21 de junho de 2005

Absolutamente extraordinário



Em Setembro de 2003 visitei (melhor, invadi) a Casa Pacheco de Melo, Prémio Secil de Arquitectura 2002. A forte impressão que a casa me causou tem-me acompanhado. Cada vez que volto àquele sítio (agora só através de fotografias e desenhos) o fascínio e admiração pela obra crescem. Nunca cheguei a agradecer propriamente ao nosso anfitrião, pois perdi o papel onde tinha escrito o seu endereço de e-mail. Descobri hoje (completamente por acaso) que o João Pacheco de Melo tem um blogue, O lugar da ponta delgada. Caro João, aproveito então para lhe agradecer, quase dois anos depois, a sua simpatia e amabilidade.

Da cor (por exemplo)

«(...) a cor, numa paleta tentativa, buscando a fonética mais do que a semântica (...)»

Da Memória Discritiva, Piscinas Municipais da Outurela, Manuel Vicente

A ideia de que na arquitectura a fonética pode sobrepor-se à semântica é, além de uma blasfémia, um sinal da liberdade estilística pela qual Manuel Vicente tanto se bate(u). E é triste ver que anda tanta gente a tentar justificar a sua fonética como se fosse resultado de uma semântica apurada.

segunda-feira, 20 de junho de 2005

Desvantagens de não ter caixa de comentários

O recado terá forçosamente de seguir por post. Tulius, Tulius, não te ponhas com merdas. O enlace bombástico é claramente um ponto de honra que se exibe orgulhosamente (experiência própria, também já passei por isso), mas esse discurso modesto não fica bem a um tipo que já se (ou)viu elogiado, em directo, por Pedro Lomba na rádio. Sim, sim, ouvi eu com estes dois ouvidos que a terra há-de..., quer dizer, isto se não for cremado, dizia, lembrava, o Pedro Lomba dizer (com a aquiescência de Pedro Mexia) que o Memória era um dos seus blogues de eleição («muito bem escrito por um estudante de biologia que vive em Nova Iorque, o que prova que na blogosfera se descobrem talentos literários fora do mundo das letras», cito de memória, sem exactidão). Eu, que nesse programa radiofónico apenas me permiti sonhar ser o alvo que Francisco José Viegas mirava ao dizer que havia blogues sobre tudo, até sobre arquitectura, fico mal-tratado com este tipo de discurso. Pá, ainda por cima (agora que me ocorre outra coisa) toda a gente sabe quem é o Carlos Quevedo. Tem juízo.

Admito que estou ressabiado. Acabei de comprar o livro do Gato Fedorento e o post onde o Ricardo Araújo Pereira mencionava o meu anterior blogue está omisso. Oh, lança trespassada no meu coração...

O pesadelo dos noctívagos

De hoje para amanhã, a noite mais curta do ano.

Dois anos (no passado dia 16) de coisas destas

A peça da RTP sobre o falhanço da reunião de anteontem era notável: um primeiro-ministro luxemburguês condoído, coitado & tão indignado, um Chiraque condoído, coitado & tão generoso, um Blair sorridente passeando de chávena (de chá?) na mão, muito sacaninha. Eis como se explica o mundo. No final, Durão Barroso apareceu a dizer não sei o quê.

Europeus, nós?, no Aviz

Resta-me dizer que gostei de ver Blair a passear-se com aquela chávena (de chá, concerteza) na mão. E de ouvi-lo explicar as contas simples do seu veto. Cada dia que passa fico com menos dúvidas de que Blair é único estadista europeu. E vem aí a sua presidência.

Coisas simples / complicadas



Casa Ugalde (1951), José Antonio Coderch

domingo, 19 de junho de 2005

Gato Fedorento, o livro


E os tipos não apagaram o blogue. Sim, os tipos não apagaram o blogue.

sábado, 18 de junho de 2005

Arquitectura no Cartaxo

Hoje, no Mil Folhas, Ana Vaz Milheiro escreve sobre o Centro Cultural do Cartaxo, projecto recém-inaugurado da dupla Cristina Veríssimo e Diogo Burnay. O projecto é bom, muito bom. Ana Vaz Milheiro lembra, muito justamente, de onde aparecem as influências:

(...) Sente-se a presença, quer de Manuel Vicente, com quem Diogo Burnay colaborou em Macau, quer da iraniana Zaha Hadid, em cujo escritório londrino Cristina Veríssimo trabalhou. No Cartaxo convocam-se estas duas personagens tutelares. Retoma-se a tendência pós-moderna de Vicente na identidade performativa dos espaços e, de Hadid, explora-se o uso acentuado de geometrias menos "puras". (...)

A arquitectura, essa, é inventiva e descomprometida (sim, talvez, e juntando às duas referências que faz Ana Vaz Milheiro, se note uma certa aura holandesa a que a arquitectura contemporânea parece não conseguir fugir). E é mais uma saudável prova de que a linguagem neo-moderna pós-Siza não é a única via em Portugal.

Sonhando acordado com locais distantes 33

Dizem que eu não faço links.

Franja da sociedade

Alegre país o nosso, onde a extrema-direita não passa de meia-dúzia de indivíduos intelectualmente muito rasteirinhos e sem capacidade para mobilizar seja o que for. Quando o porta-voz do grupo não vai além do «orgulho em sermos brancos» ou do «somos portugueses há 850 anos, não há 30, não comprámos o nosso BI no Rossio ou no Martim Moniz a nenhum preto ou nenhum cigano», percebemos que esta gente vai ficar a falar sozinha. Ainda bem.

It's alive

Mais do que a «crise» que se instalou, impressiona-me a reacção dos líderes. Palavras duras, temperamentos à flor da pele. Tudo a dizer mal dos ingleses, Chirac possesso. Confesso, é bonito de se ver. Faz falta a esta Europa drama político que combata o cinzentismo burocrata. Estas zangas de comadres aproximam os políticos das pessoas. Como diz o povo, quem não sente não é filho de boa gente.

sexta-feira, 17 de junho de 2005

Coisas simples

As Torres de Siza e as Torrinhas de Sua Kay, no Jaquinzinhos.

Sonhando acordado com locais distantes 32

A culpa é o maior de todos os excitantes. Esta é a descoberta do século.

Antes do Degelo, Agustina Bessa-Luís

Das poucas coisas que sobram de uma moral que vai desaparecendo na memória, apenas com provas vivas que insistem em permanecer nos locais mais remotos de uma sociedade se calhar apenas rural, está a sensação de que à luz do dia os actos parecem-se mais com pecados, fazendo surgir uma culpa balsâmica.

Olhe que não

«Felizmente já sabemos que o pós-modernismo é mau».

Ouvido, por interposta pessoa.

Gostava de aqui deixar claro que não é verdade. Uma avaliação estética superficial (é feio, é bonito) não basta para dizer que o «pós-modernismo é mau». Até porque o pós-modernismo é muita coisa ao mesmo tempo, o que acaba por anular o conceito. Logo, o pós-modernismo é, por exclusão de partes, apenas o statement que diz que há vida para além dos dogmas modernos. A partir daí a liberdade é total. Não me digam que isto é mau.

Companheiro Vasco*

Ide ler o Vasco Pulido Valente hoje, no Público (gamem uma password, comprem o jornal, ocupem as instalações da redação até vos ser concedido o artigo).

* E vão dois posts com este título, ambos referindo-se a artigos de Pulido Valente que abordam a temática do comunismo e do 25 de Abril. Admito, ao fim de dois anos os vícios instalam-se e adquire-se um estatuto qualquer que nos permite pecar em consciência. Ah, só mais uma coisita, não há por aí ninguém interessado em fazer o copy/paste do dito? É que eu tenho a versão impressa (curiosa coisa para se dizer que se "comprou o jornal") e tenho mais do que fazer do que estar a transcrever o texto, ainda que valesse a pena. Não? Está bem, eu faço o resumo. Basicamente, a verdade é esta: as "virtudes pessoais" de Álvaro Cunhal em pouco se distinguem de outros (Salazar, Estaline, Lenine, Hitler); o 25 de Abril a ele nada se deveu (foi, como diz VPV, resultante da queda própria da ditadura e da guerra colonial); e, só mesmo para acabar de compôr a cena, o PREC atrasou economicamente o país "no mínimo 15 anos", sendo que Portugal esteve, resultante da acção de Cunhal, à beira de uma guerra civil. Ide, portanto, ler o artigo. Ou então não, eu sei que está calor e que apetece ir para a praia.

quinta-feira, 16 de junho de 2005

alguém deite este país no divã, por favor

Popular, apoiante de Fátima Felgueiras, solicitado a responder à pergunta porque apoia Fátima Felgueiras?:

«Olhe», com ar muito sério e compenetrado, «porque é uma... grande senhora, e por causa do nome», pausa, outra vez o ar sério, desta vez quase revoltado, «o nome, Fátima, diz muita coisa».

Perceber o povo irmão

É que só dá vontade de calçar o chinelo, apanhar o calçadão, e ir fazer da praia morada fixa.

Po

st.

Post

curto.

Faltam-me conceitos

Chega o verão e deixo de ser um esteta para passar a ser um olfecta.

Desodorizantes, meus amigos, desodorizantes

Não custa nada.

Coffee-break

Budapeste, de Chico Buarque



Budapeste não é de Chico Buarque, como é sabido, é da Hungria, o país, mas o Chico roubou-a para escrever um livro quase perfeito. Fica a sensação que todas as palavras estão no sítio certo, quase demasiado certo, calculista, estudado, premeditado, frio, como Budapeste. Talvez tenha sido essa obsessão pela forma que me impede de olhar agora para o livro e sentir a nostalgia das emoções escritas. Acho que tenho medo de coisas assim, perfeitas. Um dia vou encher-me de coragem e vou lê-lo outra vez. Um dia, talvez quando for a Budapeste.

Deviam proibir os transeuntes matinais de falar

«Ó pá» dizia ela, «aquilo é mesmo grande, estás a ver, eu entrei na Basílica de S. Pedro e aquilo nem parecia uma igreja, parecia um museu, mesmo, cheio de gente, tipo um daqueles centros comerciais que...» e o meu passo apressado denunciou a fuga de quem não queria ouvir mais. E não ouvi mais.

quarta-feira, 15 de junho de 2005

Sonhando acordado com locais distantes 31

«O Brad Pitt não anda a partilhar lençóis comigo e não o vês a postar merdas dessas, pois não?»

Qual luta?

Anti-fascista parece-me o melhor elogio que se lhe pode fazer. Por linhas tortas, está certo, mas o homem lutou contra o que existia. Agora, trinta anos depois daquilo porque tanto sofreu mas que a ele nada se deveu, pergunto aos populares que gritam o estafado slogan, vezes sem conta: qual luta?

Quinze de Julho

A partir de hoje, trinta dias. T-r-i-n-t-a d-i-a-s.

A grande, grande proeza de Brad Pitt



Pôs Zaha Hadid a rir.

Foto gamada daqui por indicação da Susana.

(Esta coisa do Brad Pitt agora ser arquitecto dá aso a muitas metáforas e piadolas. Mas a mim incomoda-me. Admito, é inveja. Carago, eu não ando para aí a fazer filmes e a partilhar lençois com a Angelina Jolie, pois não?)

Coffee-break

Dito assim, sem juízo de valor

Era uma conferência sobre Levi-Strauss a que se seguiram algumas perguntas mornas. As jovens estudantes pareciam interessadas em encontrar a relação entre o antropólogo e as calças Levis.

Antes do Degelo, Agustina Bessa-Luís

Quinze de Junho

Quinze, afinal.

terça-feira, 14 de junho de 2005

Porque pulula Jude Law pela blogosfera feminina



E o sotaque, o sotaque.

Oito de Junho

Entretanto, no dia do nascimento de Frank Lloyd Wright, os tipos do Google sairam-se com esta.

Catorze de Junho

A blogar há dois anos.

Ser consequente

Há um valor acrescentado que a arquitectura deve ambicionar. O depois tem, obrigatoriamente, de ser melhor que o antes. É por isto que a arquitectura nunca é só a resolução de um problema funcional e construtivo de um determinado empreendimento que se rege por um programa. A envolvente deve beneficiar da intervenção. Se quisermos, a boa arquitectura gera mais-valias. Ganhos indirectos. Quanto a maestria é atingida fica a sensação que o edifício sempre ali deveria ter estado. O Siza consegue isso, e é talvez por isso que o Siza é o Siza. O Souto Moura também. Mas enquanto o Siza consegue-o através de uma sensibilidade poética que, estranhamente, se assume como essencial, Souto Moura chega lá através da exactidão da economia de meios. Não é fácil, mas ninguém disse que era. Para trás (na memória) ficam as obras inconsequentes. Os gestos frívolos que aparecem nas revistas. Chego de Graz e Graz tem muito disso. Senti-me bem ao conseguir explicar o que sentia pertante aquela arquitectura levemente apelativa. No fundo não transforma nada. É um discurso algo autista. Falta-lhe peso, no sentido literal também. Não é preciso que andemos todos a tentar entreter o parceiro. As coisas só precisam de ser bem feitas. Com cimento e pensamento (TM), claro. Com mais consequência e menos aparato. Acho que estou a ficar velho.

Compreender o «Álvaro»

A ler o artigo de Vasco Pulido Valente, hoje, no Público.

Coito interrompido

Projectos que não saem do papel.

segunda-feira, 13 de junho de 2005

Sonhando acordado com locais distantes 30

É muito elogiado o luso vocábulo saudade como uma singular expressão de um sentimento por definir. O elogio decorre da inexistência de semelhante conceito em idiomas estrangeiros que se vêem forçados a recorrer a outras formas para tentar (e julgamos que apenas tentam) dizer o mesmo. I miss you ocorre-me como exemplo. O bom-senso, não, o senso-comum (assim é que é) não hesita em sub-classificar o dito fazes-me falta em relação ao uso da original entrada do dicionário português. Saudade, uma melancolia suave de uma memória agradável que se deseja projectada no futuro. É aqui que descubro o meu argumento: a suavidade da palavra não me serve. A melancolia tem dificuldade em descobrir lugar em mim onde a sensação de ausência exige uma resposta mais decidida.

Fazes-me falta.

Na morte, sê justo

Causa sempre alguma impressão, por ocasião da morte de um qualquer capataz da irresponsabilidade pátria, o elogio da obstinada “coerência” que souberam acalentar em vida. Experimentaram as "utopias" que a sua subjectividade supunha urgentes com consequências desastrosas para milhares de portugueses.
Um erro não é menos erro por ser assumido convictamente até ao fim dos dias.
Nunca ninguém lhes pediu a conta.
Paradoxalmente, para estes, o mais alto momento da impunidade é a hora da morte.

in hARDbLOG

Now showing at the English Royal Cinema*



- What would be the scientific purpose of killing it?
- Revenge.

*Graz

Cry

Se eu fosse um bom blogger sairia post sobre a mulher que chorava desalmadamente, sem tentar disfarçar, no aeroporto. Quando passei por ela, já no avião, continuava entregue às lágrimas. Distinguia-se: era baixa, morena, olhos pretos e grandes (e húmidos). Era um choro de perda. A sua indiferença ao que à volta se passava deixava bem claro que, naqueles momentos, nada mais fazia sentido. Não tentava secar a água salgada que lhe cobria o rosto, nem parecia incomodada por estar tão exposta aos outros. Simplesmente chorava enquanto o avião levantava voo dali para fora. Seria por isso?

Epá, é isso, ou não escreve de todo, não excluir essa possibilidade

Consta esta na ideia de que um blogger, quando feliz na sua vida pessoal, escreve menos, de um modo menos dedicado.

P.S: Volto. O Saraiva diz disparates, a praia de Carcavelos foi invadida por rufias, Cunhal morreu. E novidades, não há?

quarta-feira, 8 de junho de 2005

Sonhando acordado com locais distantes 29

To be continued.

Fogo de vista

Ano de eleições autárquicas: multiplicam-se os concursos públicos de ideias para «intervenções», «requalificações», e «valorizações» de todo o tipo de equipamentos e espaços públicos. Não é uma denúncia, não é uma queixa, apenas uma constatação. Projectos que, claro, só muito dificilmente verão a luz do dia.

terça-feira, 7 de junho de 2005

Sonhando acordado com locais distantes 28

Muitos são aqueles que identificam a diferença entre a realidade virtual e a realidade real na ausência de tacto por parte daquela. Não poder sentir (e aqui se mostra a força deste preconceito: o verbo sentir é usado para descrever a sensação do tacto, quando o seu significado é bastante mais amplo do que o do simples contacto entre duas superfícies) algo, alguém, assume-se como a barreira inultrapassável, a linha onde se traça a fronteira entre o acontecimento e a simulação. Não quero negar esta evidência, mas parece-me que nesta conversa toda o olfacto é claramente sub-valorizado. De qualquer das formas os dois não andam muito longe um do outro: do que se fala, afinal, é de coisas que se fazem de olhos fechados, como que a assumir a impossibilidade de se conseguir intimidade de outra maneira.

Lembrem-me, por favor

de assinar esta revista. Os gajos já me mandaram duas cartas a perguntar porque é que ainda não paguei se já recebi dois números da revista e eu só consegui acenar com a cabeça reconhecendo a minha falta. Contudo, contudo, ainda estão por depositar os 35€ na conta dos senhores lá na Holanda ou o que é. E a revista vale a pena. Porque é bem feita, é grande (isto é importante porque dá para espetar grandes fotos com desenhos que se vejam, não apenas aquelas plantas à escala 1:659 [a Architectural Review dá-se ao trabalho de colocar a escala correspondente nos desenhos que publica em, obviamente, scale to fit, o que dá coisas destas, quando não é 1:719, por exemplo]), e tem um espírito saudável: defender a tese que existe uma arquitectura europeia usando exemplos de novos arquitectos (seja na idade ou no desconhecimento do público). Por isto tudo e porque é barata (é, é, garanto-vos que 35€ por 6 números é barato, é uma pechincha), lembrem-me, por favor, de torná-los 35€ mais ricos.

P.S: Ninguém, por chance, tem aí 35€ que me adiante, não?

Entretanto, na europa civilizada


Showers

High: 18°
Low: 8°

Estado de sítio


Sunny

High: 34°
Low: 18°

segunda-feira, 6 de junho de 2005

Proposta para o artigo 449º do tratado que estabelece uma constituição europeia

Calar indivíduos de nome Fátima Campos Ferreira concede benefícios fiscais.

Being José Marinho

«O Abrupto que se prepare, em breve terá companhia», anuncia-se no recém-chegado Being José Mourinho. Eu não quero ser desmancha prazeres, mas a única semelhança que eu consigo encontrar entre isto e o Abrupto (early days) é a desconfiança da autenticidade da sua autoria. Pedro Rolo Duarte, ele mesmo, na blogosfera? Não, Tulius, isto ainda é melhor do que um hipotético blogue de Eduardo Prado Coelho. Ok, não é, mas permitam-me o exagero.

Mar tunis

Estádio flat
O adepto eufórico ia levantar-se para fazer a onda, mas parou. Lembrou-se que o pequeno Martunis estava na bancada.

Rui Branco

Da Feira do Livro

Pela primeira vez subi e desci o parque sem ter tocado na carteira. Não foi a crise, foi desinteresse. Apenas retive um título: A Bíblia Pós-Moderna, mas nem sequer cheguei a folhear o volume receando estragar o momento. Lá voltei para casa de mãos a abanar mas com a imaginação a fervilhar com um Messias que anuncia a desconstrução do seu discurso, o relativismo dos seus milagres e a instabilidade do conceito de verdade.

Sonhando acordado com locais distantes 27

Escreveu uma carta de amor na biblioteca, enquanto toda a gente pensava que estudava. Sentiu o orgulho de quem comete uma infração pública sem ser notada. Ainda que desconfie de duas personagens que pareceram estranhar o sorriso impossível de quem estuda.

O elogio da curva



Estação de Autocarros, Cáceres, Justo García Rubio
em destaque no A Weekly Dose of Architecture

domingo, 5 de junho de 2005

O paralelipípedo cinzento

Júlio Machado Vaz postou a sua casa (ainda que, infelizmente, as fotografias não sejam de grande qualidade), casa essa a que me referi aqui.

Sonhando acordado com locais distantes 26



A metereologia do meu subconsciente escapa ao meu controlo.

A ler

Os começos n'A Natureza do Mal. Junto mais dois (sem qualquer critério a não ser a minha memória recente):

Assola o país uma pulsão coloquial que põe toda a gente em estado frenético de tagarelice, numa multiplicação ansiosa de duos, trios, ensembles, coros. Desde os píncaros de Castro Laboreiro ao Ilhéu do Monchique fervem rumorejos, conversas, vozeios, brados que abafam e escamoteiam a paciência de alguns, os vagares de muitos e o bom senso de todos. O falatório é causa de inúmeros despautérios, frouxas produtividades e más-criações.

Fantasia para Dois Coronéis e Uma Piscina, Mário de Carvalho

I was twelve years old the first time I walked on water.

Mr. Vertigo, Paul Auster

A ler

A crítica e a-crítica, no hARDbLOG.

Link

Ouvir os amigos dizer (em tom de queixa) que é a través do blogue que ficam a saber o que se passa na minha vida é uma situação (infelizmente) normal, mas foi a primeira vez que alguém me disse que soube alguma coisa sobre a minha vida no blogue dela.

sábado, 4 de junho de 2005

Perder uma piada

O último post podia (deveria) ter-se chamado educação sexual.

Os americanos têm toda a razão

Na reportagem da revista Sábado sobre Alexandra Lencastre desta semana revela-se que a produção original norte-americana da Rua Sésamo quis, na altura, tirar a atriz do programa porque «tinha medo que as crianças se masturbassem a ver o programa». Ou chegaram tarde demais ou a parte do «ter medo» foi apenas um pseudo-moralismo mal disfarçado. De uma forma ou de outra a Rua Sésamo foi um sucesso. E não será ao Poupas que devem ser atribuídos os louros.

Sonhando acordado com locais distantes 25

Em contra-luz nota-se a etiqueta que diz 1€90, desmentindo assim a teoria que sustenta que o euro terá provocado uma inflação nos preços. Uma simples (e simplista) análise económica à situação em questão revela facilmente que a globalização é fixe. Como naquele anúncio de um supermercado que passava há algum tempo, eu ainda sou do tempo em que (informação não disponível) apenas custava um euro e noventa. O cliente agradece do fundo do coração.

sexta-feira, 3 de junho de 2005

Sonhando acordado com locais distantes 24

Transit flight parece definir melhor o conceito. Em trânsito há uma recusa implícita da permanência num lugar que impede qualquer memória futura, mesmo com os cigarros underpriced no fundo do saco a servirem de prova incriminatória. Zurique, Munique, Frankfurt são neste momento uma única e a mesma cidade onde não me quero demorar mais do que o necessário (demasiado). Resultado da política de preços diferenciada das companhias de aviação disponíveis percebo agora que comprei 3 horas em trânsito por 50 euros. Menos 3 horas, assim é que está correcto. Poderia multiplicar por dois este valor mas seria um truque digno de secretário de estado do orçamento, já que na segunda volta - a volta - as horas gastas em Zurique Munique Frankfurt (riscar o que não interessa) não passam de tempo morto em ambiente morto. Olhando à volta já só interessa a próxima vez que ali estarei no sentido inverso.

Poesia

Ingredientes:

1 kg de peru
1 kg de vitela
1 galinha gorda
2 kg de carne entremeada da parte da cabeça do porco
10 dentes de alho
4,5 de pão de trigo
1 l de azeite
2 malaguetas cerca de 200 g de colorau
Sal


Preparação:

Colocam-se as carnes bem lavadas, para cozer numa panela com água temperada com sal, três dentes de alho e as malaguetas picadas. Quando as carnes estiverem cozidas, desfiam-se e cortam-se aos bocadinhos. O caldo volta ao lume. Para uma caldeira, corta-se o pão às fatias, escalda-se com o caldo a ferver, passando por um passador de rede. Tapa-se para abeberar. Depois, colocam-se as carnes, por cima dos restantes dentes de alho picados e o colorau. Rega-se com azeite bem quente. Mexe-se bem com uma colher de pau e enchem-se as tripas de vaca, bem lavadas. Atam-se dos dois lados, dando dois nós; dá-se um nó, depois volta-se a tripa e dá-se outro. Deixam-se cerca de quinze centímetros de fio, para enfiar a vara no fumeiro. Lavam-se em água tépida e põem-se no fumeiro, onde ficam durante cerca de um mês. Cozinham-se, de preferência, assadas nas brasas, em lume muito brando. Previamente, devem ser picadas com uma agulha, enquanto assam, para evitar o rebentamento.
Servem-se com grelos e batatas cozidas.

quinta-feira, 2 de junho de 2005

CPM

2005: e vão dois
A provar que os meus namorados encontram a felicidade depois de me conhecerem está o facto de saírem dos meus braços para os da mulher com quem casarão.

Ao vento



"Só podem ser implantes", desdenhou, ao ver as caixas de comentários do blogue da vizinha.

O Bandeira chegou à blogosfera.

Lisboa despolitizada*

Na «comissão política» de José Sá Fernandes está alguém que eu já ouvi dizer «temos de ser contra tudo, com mas com a devida ressalva de ser também contra o Bloco de Esquerda.» E é por isso que me sinto tentado a juntar o meu voto a este projecto (e também porque se propõe como «medida imediata» a execução do corredor verde, projecto de Ribeiro Telles).

*A lista de apoios do candidato junta gente da extrema-direita à extrema-esquerda.

A adolescência masculina explicada em versão completa, revista e detalhada

(...) transferir o fetiche por bolas [de futebol] por uma tara por mamas (...)

Ivan

Não o quê?

Há uma coisa que me anda a fazer muita confusão: as conclusões que se têm multiplicado sobre os resultados dos referendos ao tratado da constituição europeia. Parece-me absurdo que se tente analisar os resultados à luz de uma suposta racionalidade no voto do povo (francês e holandês). A democracia é, sem dúvida, o pior dos sistemas políticos à excepção de todos os outros, e neste caso especialmente o que foi a votos nada teve a ver com os 400 e tal artigos do tratado. Ninguém os leu, ninguém os percebeu. Considerar que o voto no referendo foi um voto esclarecido é uma loucura. O resto é aproveitamente político, é a deturpação do significado das votações conforme o nosso bel-prazer. E não é bonito.

Writer talk

Paul Auster ontem disse que um «bom dia de trabalho» é aquele que consegue produzir «uma página». Uma página. Uma. Página. É um «bom dia de trabalho» para Paul Auster. Auster, lembre-se, escreve como profissão. Uma página. É razão de contentamento. Há que invejar este homem.

Perante a estupefação de Ana Sousa Dias, Auster explicou que pode ficar horas a escolher «a word». «A word?», pergunta Sousa Dias, «Not a sentence, but a word?», ao que Auster responde «Yes, a sentence too, but without words there are no sentences».

quarta-feira, 1 de junho de 2005

Avisa-se que

Hoje, às 23.30, Ana Sousa Dias entrevista o tal literariamente parecido com Paulo Coelho.

Sonhando acordado com locais distantes 23

Mesmo na arte (ênfase na palavra mesmo) o que conta é a transpiração (diz-se), e não a inspiração a que muitos recorrem para explicar a obra. O líquido que foge da pele deve ser, no entanto, provocado pela intensidade da actividade laboral, e não pela obscenidade da temperatura que se tem verificado na capital do ex-condado roubado aos espanhóis pelo tipo que bateu na mãe. Assim sendo, poder-se-ia (notar o tempo verbal) advogar a inexistência de um incentivo metafísico que justificasse os resultados obtidos. Correndo o risco de passar por criatura mística, asseguro que neste caso tal empresa será infrutífera: a musa tem a sua cota parte de responsabilidade (quer na inspiração, quer na transpiração), cota essa que arrisco totalitária.

Sonhando acordado com locais distantes 22

O exagero. A hipérbole benigna que se transforma no meio previligiado de expressão. Não por escolha mas por fatalidade. Acaba por ser assim, sem ninguém dar por isso. E como está escrito não vale a pena se a escala não for alterada. Qual escala? Só a mera ideia de que existe uma escala pela qual se mede o bom-senso, o equilíbrio, a normalidade, dá vontade de tentar a aproximação ao ridículo. E se isso for conseguido? Afinal que o acusa não pode prová-lo. Não o pode provar porque não lhe conhece o sabor (se conhecesse a questão não se poria). Não o pode provar porque não se tratam de factos demonstráveis nem de números de confiar. Sobra só a cumplicidade no acto que justificará todas as grandezas. E exageros.

Sonhando acordado com locais distantes 21

«Look, smile and understand without putting it into words.»

Sobrevoando as ruínas de Lisboa



Aterro da Boavista. Edifício arrendado e sub-arrendado a uma população africana e ilegal. Ruiu, por completo, na área das cozinhas e casas de banho, sujeitas a sobre-cargas incomportáveis devidas a obras e mais obras ilegais. Por sorte, e como se trata da tal população «africana e ilegal», todos tinham saído de casa às 6 da manhã. Não houve vítimas. Nem feridos. Apenas mais uma ferida urbana que levará uma eternidade a sarar e umas dezenas de realojados (alguns dos quais, devido à sua situação, sem possibilidade legal de receber ajuda camarária). Lisboa, ano de 2005.

Sunburn 2

Só dá vontade de ir para A Praia.

Sunburn

Numa tentativa de me incluir dentro de padrões minimamente aceitáveis de normalidade, imagino que todos os lisboetas hoje estão, literalmente, a passar ao estado líquido se expostos ao sol.