sexta-feira, 12 de março de 2010

Sair do armário

A minha primeira vez foi aos 16 anos. Exactamente: a primeira vez que alguém notou que eu tinha cabelos brancos, eu tinha 16 anos. A partir de então, os sacaninhas não desarmaram. Reproduzem-se mais depressa que judeus no colonato. Resultado: estou grisalho. Não é «estou a ficar grisalho», como os grisalhos por vezes dizem, é mesmo «estou grisalho». Entendo que «grisalho» se define por uma maior percentagem de cabelos brancos face a cabelos de outra cor, e se adoptarmos essa definição, estou grisalho. Saio hoje do armário porque não fui capaz de conter as lágrimas e o soluço ranhoso enquanto segurava o cabelo que me caía no barbeiro. Foi mais forte do que eu. É isto fim? Aparentemente não: vivo rodeado de gente que me diz «antes tê-lo branco do que não ter.» E é verdade: eu tenho muito cabelo, o que só aumenta o número absoluto de cabelos brancos. Muito mesmo, vocês ficariam espantados: tenho ainda mais cabelo do que seria de esperar de alguém que se chama cruelmente «Lourenço». Tenho tanto cabelo que o meu barbeiro hoje só me reconheceu ao fim de seis minutos. E ele, boa pessoa, interessada no meu bem estar, lá repetiu: «antes tê-lo branco do que não ter.» Um dia ainda hei-de apresentar aos meus amigos o José Eduardo Bettencourt.