Obviamente, não é discutível que Lídia Jorge seja escritora; Lídia Jorge é escritora, ponto. O que percebemos deste texto de João Gonçalves é que João Gonçalves não gosta de Lídia Jorge, não gosta dos livros de Lídia Jorge (deixemos Clara Ferreira Alves fora da conversa). Dizer, por não se gostar dos seus livros, que Lídia Jorge não é escritora, tem subjacente a ideia de que ser escritor é uma virtude (que João Gonçalves não reconhece em Lídia Jorge) e não um ofício (escrever é um ofício; qualquer pessoa que ganhe a vida a escrever - e isto inclui os argumentistas das novelas da TVI - é um «escritor). É, defende João Gonçalves, um estatuto moral que apenas é conferido àqueles que achamos que o merecem (e com isto estamos a colocar a nossa opinião num pedestal que nos deveria desqualificar à partida). Para João Gonçalves, não existe o conceito de «mau escritor»; um escritor é - como Deus? - e esta formulação não admite variantes. Esta ideia - para além de agressiva - é auto-destrutiva: não duvidamos que João Gonçalves tem coisas para dizer da escrita de Lídia Jorge (eu, por exemplo, acho-a aborrecida e excessivamente poética - cá está: para mim, «poético» também não é virtude, é apenas um adjectivo), mas ao implodir à partida qualquer hipótese de diálogo João Gonçalves destrói qualquer pertinência que a sua avaliação poderia ter. Ficamos a saber que João Gonçalves tem uma opinião sobre a escrita de Lídia Jorge mas que se recusa a revelar; por temer o confronto, esta é uma atitude cobarde.