No Prado resisti cinco minutos. Isto é, a minha concentração resistiu cinco minutos. Retive apenas algumas cenas de El Greco, um auto-retrato de Dürer, e as inevitáveis Meninas. Já no Reina Sofía a vontade era a de ficar e ficar, até ser expulso. Também pela arquitectura (o Prado tem uma estrutura de museu mais tradicional, de sucessões de várias salas, enquanto que o Reina Sofia ocupa um edifício que se organiza em volta de um claustro que ilumina as grandes galerias de circulação, tipologia que se revela adequadíssima para um museu), mas principalmente pela interpretação que faço da arte. Há quem valorize a estética acima de tudo, ou os valores positivos, por exemplo. Para mim a arte é transgressão, sempre. É o único veículo para ser de outro modo, para dizer outras coisas. Por isso a arte de encomenda nunca me excitou: seja o imaginário bíblico visto e revisto no Renascimento ou os retratos reais de Luís Pinto Coelho (reparo agora que há outros retratos reais que me entusiasmam, como o retrato de Isabel II por Lucien Freud, mas aí é também o factor de transgressão que me atrai). O facto do Reina Sofía estar em Madrid, essa Cidade-Estado, contribui para este fascínio.
Estava tão fascinado a andar de um lado para o outro que vi a Guernica como se de outro quadro qualquer se tratasse. Talvez porque tenha perdido essa componente de transressão e se tenha tornado num produto de exportação nacional, abraçada pela "instituição". Não falo do quadro em si, mas do que o quadro representa. E não é tão fácil assim separar as duas.