Já tinha dado pelo texto na Visão. Vejo agora que o Pedro Mexia o colocou no blogue, poupando-me à transcrição. Se se pudesse definir Agustina em 230 palavras, apenas 230 palavras, seriam (e são), num intervalo de confiança de 95%, estas:
Entre muitas, três características fazem o génio e o fascínio de Agustina.
Desde logo, a improvável aliança entre os universos de Camilo e de Musil. Histórias nortenhas com ancestralidade, velhas casarões, matriarcado e pundunores desagravados (mas sem melodrama nem domésticas como leitoras). E digressões ensaísticas, agudas farpas sociais e finíssimas análises de carácter. Em Agustina, o narrador é Agustina, uma força da natureza, tão perspicaz como implacável, e que não discute nunca a sua autonomia.
Depois, Agustina inventa uma classe social, uma alta burguesia meditativa, uma aristocracia aforística, que tem e teve sempre pouca correspondência na vida real. É um Lampedusa mais selvagem que imagina as suas personagens demasiado inteligentes para conviverem com outras pessoas, demasiado cruéis para gostarmos delas, demasiado sexuais para serem confiáveis. Não há naturalismo nos seus romances, mas um realismo algo mental e tão concreto como a inveja ou o desprezo.
Finalmente, Agustina disseca aquilo a que se chamava antigamente a “alma humana” (antes desses bisturis que a procuravam sem jeito nenhum). É um freudismo com prática clínica e tudo. Agustina gosta de provocações, mesmo as subtis. E nunca procura agradar. A sua máxima é o máximo de boas maneiras e o mínimo de lisonja. Nenhuma verdade é amável, e mesmo a “verdade” não é alicerce que se recomende. A angústia é em Agustina uma forma de alegria porque, como escreveu, sem imperfeições não existe beleza.