quarta-feira, 22 de agosto de 2007
Estes correios
«Estes correios...», desabafava a funcionária dos correios, exteriorizando o que lhe ia na alma e adivinhando o que ia na minha. Comecemos pelo princípio. Os CTT e os seus balcões há muito que parecem empenhados em ser co-autores deste blogue. A quantidade - e qualidade - da matéria prima que fornecem é suficiente para justificar o epíteto. Desta feita a coisa parecia que iria correr sobre rodas. No sítio mais bonito do país, que acontece ficar a dois passos da minha casa, a estação estava vazia. Fui atendido prontamente, apresentei o papel para levantar o documento à cobrança, e esperei. A senhora levantou-se. Foi lá atrás. Voltou com o pacote na mão mas não se dirigiu imediatamente para mim. Ficou a segredar coisas com a colega lá da ponta. Percebi que algo se passava. Quando voltou ao seu lugar, exclamou: «bem, há sempre uma primeira vez para tudo». Mais tarde iria perceber que este tinha sido o momento em que tudo se começou a precipitar. Puxei do bloco de notas. Um blogger avisado vale por dois. O sistema, sempre o sistema: o principal inimigo do funcionário. Enquanto olhava para o monitor, a funcionária anunciava e explicava o desastre iminente: o sistema foi mudado, agora os vales são directos, etc, obviamente eu não estava interessado. A chefe chegou, pois a colega do lado assim o informou: «a chefe chegou em boa altura». Fiquei pasmado: aquela senhora não dirigiu a palavra a ninguém, nem sequer o coloquial «bom dia». Escusado será dizer que todas as funcionárias (estava num feudo feminino) seguiram a chefe, não lhe dirigindo a palavra. Um local de trabalho onde as pessoas não se dizem «bom dia» é um barril de ressentimento, pensei eu. Entretanto, a culpa (como seria informado no final) continuava a ser do sistema, que insistia em contraria toda a lógica. Pelo menos a lógica da funcionária, que achava que nada daquilo «fazia sentido». Eu, que estava silenciosamente agradecido por tanto material, nada disse quando a colega do lado, um pouco mais expedita, interveio: «mas porque é que não aceitas o dinheiro do senhor e acabas isso depois?» A senhora que me estava a aviar explicou: «porque não vou poder chamar mais ninguém enquanto não acabar isto». O mexilhão (eu) que se lixasse. A colega, continuando a provar ser mais diligente, persistiu: «mas o senhor não tem culpa disso». Isto não é um post, pensava eu, é todo um conto carregado de deduções antropológicas. Deixei-me ficar e redobrei a atenção. Infelizmente, e apenas decorridos 20 minutos, o episódio parecia ter chegado ao fim. A mulher (para quem eu já tinha perdido toda a paciência) mudou de posto e imprimiu o vale noutra máquina, desta feita introduzindo notórias alterações no procedimento, provando que a culpa não era do sistema, mas da sua sistemática incompetência. Quando voltou pediu-me desculpa, acrescentando: «a culpa não foi minha, foi do sistema.» Foi aí que percebi que tinha sido atendido pela esposa de Octávio Machado.