domingo, 8 de março de 2009
Sábado de sol
De todas as pessoas que certamente reavaliaram a sua escolha de passar o dia de sábado estendidas ao sol nos relvados do Parque Eduardo VII quando o «cordão humano» dos professores começou a fazer barulho aos microfones no Marquês de Pombal, nem uma revelava uma história genética minimamente aproximada com aquilo a que se convencionou chamar de «português». Nós não fazemos isso, não nos deitamos nos relvados quando aparece um sol de Março; nós não saímos sequer à rua, pois durante todo o trajecto da Baixa até ao Parque contei pelos dedos de uma mão o número de pessoas com quem não iniciaria uma eventual conversa em inglês. Aquela esplanada junto ao lago dos patos estava a meio-gás; era sábado, estava sol, a imperial é a 1,40€ e trazem-nas à mesa. Ali ao lado os patos batem as asas, mergulham a cabeça na água, fazem-nos inveja e a espaços roubam a nossa atenção ao jornal. Foi preciso aproveitarmos a proximidade geográfica para dar um salto ao supermercado de uma cadeia de lojas espanhola para se desfazer o mistério da ausência de pessoas na rua. Estavam ali todos, aos magotes, sentados naquelas mesas indistintas que servem vários restaurantes, a comer gelados debaixo da iluminação artificial, a controlar o choro das crianças que certamente prefeririam estar a ver os patos a bater as asas e a mergulhar a cabeça na água. Mas como se pode escolher ficar ao sol a olhar para um pato a bater as asas e a mergulhar a cabeça na água quando se pode ficar a olhar para aparelhos de televisão que mesmo comprados em suaves 36 prestações são demasiado caros para a nossa carteira?, adivinho-lhes os pensamentos enquanto observo os passos leves e cadenciados que caracterizam o «passeio». Antigamente havia o passeio-público, mas o antigamente é uma palavra feia que não se conjuga com o progresso e para a frente é que é o caminho. Antigamente usavam-se chapéus, e o crime civilizacional que foi o seu abandono talvez encontre explicação no facto de já não ser preciso proteger a cabeça da intempérie. Lá dentro não há brisas leves, não há sol ameaçador, não há animais à solta. Há um parque de estacionamento a 0,80€ à hora, ar condicionado, produtos que se vendem a suaves prestações, serviços que guardam as crianças sob a protecção de um colete colorido e de um cartão com um número a condizer. O fim-de-semana é tão libertador.