segunda-feira, 17 de janeiro de 2005

Odd

Paulo Cunha e Silva escreveu ontem uma perturbada crónica sobre a Casa da Música:
«A Casa da Música é um dos mais perturbantes objectos da paisagem cultural portuguesa. É perturbante metonimicamente. Quer dizer, é perturbante nas formas mas também nos conteúdos. É perturbante no processo, no método, mas também nos resultados. É um objecto perturbante e absolutamente perturbado. Como se a sua natureza compulsasse a natureza do mundo. Ela é perturbada e é também um foco de perturbação. É por isso, uma forma, um objecto, com conteúdo fascinante.»
Continua, a falar do edifício. Mas o mais perturbante disto tudo é que Cunha e Silva não consegue escever uma linha que seja sobre o edifício, um argumento, uma análise, por mais simplista que seja. Limita-se a dizer que é um objecto «perturbante», que cria «rupturas», e que «cai do céu como um projéctil que a balística não fez chegar ao destino». O que não chega, não chega mesmo. O elogio à arquitectura baseado apenas na diferença não interessa. É estéril e sem consequências. O que perturba no meio disto tudo é a sensação que fica que isto pode ser uma opinião generalizada: a Casa da Música é um sucesso porque é um objecto estranho. Apenas por isso. Talvez a arquitectura seja uma arte, e como arte possa estar abrangida pela premissa de Sontag, against interpretation. No aspecto meramente formal da coisa, diga-se. Mas, e se a democracia é para ser levada ao extremo (não consigo pensar em Koolhaas sem ser um animal político), isso significaria que o direito à diferença é para todos. Repare-se, é o direito, não o dever. Assim este culto pela diferença aliado ao direito de ser diferente poderá gerar situações bastante desagradáveis. O melhor é que é se esfriem os dois, o culto e o direito.