domingo, 28 de maio de 2006

Tudo me parece profundamente errado

Contado não se acredita, e mesmo agora, passadas algumas horas sobre o evento, ainda me é difícil encontrar o tom certo. Sei que o reaccionarismo, o moralismo de algibeira, o ressabiamento face ao mundo, o snobismo como atitude fundadora, etc, etc, não chegam para explicar, muito menos perdoar, a performance deste conhecido padre lisboeta, de carregados óculos de massa que lhe toldam a visam. Sei que a arrogância, o desprezo, o paternalismo, a má-educação crónica, a linguagem agressiva e taberneira, a completa falta de tacto, a deturpação abusiva de textos essenciais sob forma de «raciocínio», tudo isto e mais outras tantas, ultrapassou o pior dos cenários por mim temidos. Ia avisado, mas julguei que conseguiria, no mínimo, ignorar a coisa. Não consegui, e a revolta ainda me consome. Vasco Pulido Valente disse um dia sobre João César das Neves que este parecia saído de uma paróquia do Minho do séx. XIX (ou outro século qualquer, não me recordo). Na altura achei que isso definia bem uma certa elite decadente que se usa do catolicismo para combater o mundo, que obviamente não está feito para eles, que não compreendem, que condenam e vivem para condenar. Hoje percebo que isso é um eufemismo. E percebo que aquilo que é verdadeiramente inaceitável não é o que se diz, mas como se diz. Nas várias conversas que fui tendo ao longo do dia, e na tentativa de tentar explicar o grau de insanidade que a reputada (até me custa a escrever) personagem vinha apresentando, usei várias vezes a palavra «boçal». Confiro no dicionário e percebo que é mesmo isso: estúpido, rude, inculto, grosseiro. É gente destas, gentinha que merecerá a nossa misericórdia futura, que mancha e conspurca a imagem de uma instituição. Que vicia relações. Que quer correr com toda a gente do seu quintal, ou melhor, do quintal que ocupou sem pedir licença, para poder exclamar, naquela sua voz rouca e dicção afectada, orgulhosamente sós. Esta gente devia lavar a boca cada vez que pronuncia a palavra Cristo, cada vez que se reserva o direito de falar em seu nome. Tudo isto me deixa uma enorme tristeza, uma profunda consternação, uma vontade imensa de pegar na metralhadora e subir ao cimo do monte e começar a revolução. No fundo, e dada a dantesca temperatura que nos acompanhou durante o dia, o que eu queria era que chovesse, abundantemente, um dilúvio à moda antiga que lavasse dos corredores eclesiásticos estas ervas daninhas cancerígenas. Estou estafado.