quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

Do coração

Não entendo quem me lê. Há blogues em número suficiente para ocupar o que resta das vidas de todos aqueles que não são eremitas incomparavelmente melhores do que o meu. Ainda assim, as pessoas lêem-me. Notem, eu escrevo porque preciso. Não me lembro porque começou. Já só sei que preciso. Gosto que me leiam, não minto, mas o síndroma marxista de não querer ser sócio de um clube que me aceite com membro (ah, não era esse marxista, seu safado) assume-se sempre quando estou na presença de alguém que se diz meu leitor: não sei se quero ser lido por quem me lê. Porque quem lê uma linha escrita por mim decide, conscientemente e aparentemente de livre vontade, não ler outra coisa qualquer e eu tenho parca tolerância ao mau gosto. Para além da minha mãe, que se preocupa com o que eu faço, e da minha sogra, que se preocupa com o que eu faço à sua filha, não reconheço ao meu blogue a capacidade de atrair seja quem for. Se eu pudesse, não escrevia mais. Dedicava o meu tempo a ler mais ou a lavar mais vezes a casa-de-banho. Não que ela ande suja. Não anda. Era só uma figura de estilo cujo nome me escapa. Aliás, é um voto de fé que faço declarar isto uma figura de estilo, porque razão razão tinha a minha professora de português do 11º ano - não me lembro do seu nome, apenas recordo uma permanente de 80 centímetros de envergadura - que, ao entregar-me a prova global carimbada com um 16, soltou: «Não sei se o milagre foi seu ou se foi meu». Também não sei, era sobre Os Maias e eu tinha lido só 235 das 689 páginas. O livrinho amarelo da Europa-América fez o resto, o que serve de retrato do nosso sistema de ensino, da Europa-América e de mim próprio. Boa noite.