terça-feira, 30 de dezembro de 2008
Antes morrer numa debandada de cangurus
A culpa pode ser minha que não gosto de épicos, não gostei de Gladiador, de Braveheart, de Tróia, mas por outro lado sei que não sou parvo: Tróia é infinitamente pior do que Gladiador, eu sei ver isso com clareza, não precisam insultar. Entrei por isso para Australia com todas as reservas activas e armas de destruição prontas a detonar mas o que encontrei foi apenas o tédio e o único perigo que corri foi o de largar as granadas no chão depois de adormecer. Só hoje percebi que Baz Luhrmann é o tipo que fez Moulin Rouge, um dos últimos filmes que arrancaram 5 estrelas a pessoas de bem e que me ia arrancando a sanidade, o que explica muita coisa mas não tudo. Australia é um exercício kitsch de tanto pastiche de géneros reduzidos a duas ou três caricaturas mais ou menos infantilódes. Aliás, a infantilização da audiência parece ter sido o caminho escolhido deliberadamente, e sobre isso caberá dizer que um mamilo naquela insípida cena de amor (ia escrever «sexo», mas enfim) teria ajudado a salvar a honra do convento, mas não, lençóis a cobrir tudinho, toma lá uma omoplata e um tornozelo para te divertires e usa a imaginação, porque aviões a fazer explodir meio mundo e tipos a sangrar dos olhos e senhoras a rebentarem pelos ares pode-se ver, mas o mamilo da Nicole Kidman é que não, nem uma nádega, nem o umbigo, senhores, nós que os conhecemos bem de, por exemplo, Eyes Wide Shut, um filme esse sim porreiro apesar do Tom Cruise, paz à sua alma. O Jorge Mourinha chama-lhe «uma viagem iniciática, um western, um filme de guerra, um romance exótico, uma lição de história, um dramalhão romântico, à vez, ao mesmo tempo, alternadamente» como se fosse uma coisa boa mas não é, é péssima. Nicole Kidman é uma reprodução em plástico daquilo que uma vez foi e de Hugh Jackman apenas fica na memória o torso (e gostava que a minha heterossexualidade não fosse posta em causa). Os aborígenes safam-se razoavelmente: há uma criança, um septuagenário nu, e uma mão que morre afogada à meia-hora. O argumento está tão obcecado com os acontecimentos que se esqueceu de dar espessura às personagens. O ritmo é enfadonho de tão previsível e recorre ao truque de - atenção, spoiler - matar uma personagem de 20 em 20 minutos para ver se não é dessa que saímos da sala. E não é. Vamos ficando agozinando pelo final que só chegará ao fim de 8 horas de iterações sobre o tema do feiticeiro de Oz (somewheeeeere oooooover the raaaaaaaaaaaainbooooooow, aaarrghhhh) cantado por uma criança, assobiado por um bêbado, poluindo a atmosfera geral. Não sei qual foi a intenção, mas sei que só não dou bola preta porque ninguém me pediu nada e porque temo estar a ser politicamente incorrecto. Que saco.