sexta-feira, 26 de maio de 2006

Bate neles, vai

Coincidência ou não, João Pereira Coutinho também se atira aos arquitectos no seu artigo do último número da revista Atlântico (não me esqueci da Maria Filomena, estou só a ganhar fôlego). O seu pretexto foi a polémica sobre o plano de Siza para Madrid, o tal que abate não sei quantas árvores e amarrou uma baronesa a um tronco. Foi este, como poderia ser outro qualquer. Sempre que há um plano ou projecto arquitectónico polémico, logo cai a intelligentsia em cima dos arquitectos, e desse horror que é a arquitectura moderna. Pois bem, Pereira Coutinho ataca precisamente o Moderno na arquitectura. Concordo com alguns pontos (a «arrogância de classe» é uma evidência), e com outros, apesar de concordar com a premissa, discordo frontalmente com as ilações. Por exemplo:

(...) Podemos ler, ou não ler, Joyce. Podemos evitar, ou não evitar, Eliot, ou Schoenberg, ou Matisse. A nossa escolha é a nossa escolha: uma questão de gosto, às vezes intransmissível. Mas a arquitectura é, por definição, inescapável: ela impões-se indiferentemente como realidade colectiva. (...)

Isto é suposto ser uma crítica à «arquitectura», aos arquitectos, à «natureza autoritária» da coisa. Eu vejo estas mesmas linhas como uma sólida defesa dos objectivos da revogação do 73/73, e da inerente obrigatoriedade de serem arquitectos a projectar obras de arquitectura. Pereira Coutinho acha o contrário: porque a arquitectura é «inescapável», ela não pode estar limitada à «omnisciência estética» (bela expressão) dos arquitectos, mas sim aberta, democraticamente, a todas as «intransmissíveis» sensibilidades. Para além da má-lingua, não se percebe bem onde quer João Pereira Coutinho chegar.