«But [Lobsters] are themselves good eating. Or so we think now. Up until sometime in the 1800s, though, lobser was literally low-class food (...)»
David Foster Wallace, Consider the Lobster
David Foster Wallace é uma espécie de máquina de picar carne muito bem abastecida - não em qualidade mas sempre em quantidade. Aliás, a qualidade deixa de ser um assunto em David Foster Wallace porque um dos seus talentos é conseguir com que uma bifana salgada possa ser mais interessante do que um naco do lombo mal passado. O processo é sempre o mesmo: partir de um dado conjunto de preconceitos (inevitáveis) para proceder a uma recolha de dados o mais extensa possível que, depois de triturados, reorganizem as fundações desses mesmos preconceitos (alguns sobrevivem, outros não). E o estilo, admiravelmente voluntarioso, consegue deixar claro que é uma voz bem identificada que nos fala (DFW refere-se constantemente a ele próprio com o objectivo de sujeitar o leitor às mesmas condições que geraram o texto e com isso emprestar credibilidade emocional aos julgamentos) ao mesmo tempo que se mascara num tom jornalístico quase objectivo (ok, ok, não é líquido que o «jornalismo» e a «objectividade» se dêem bem). E ainda temos de juntar à festa a obsessão de DFW pelo subtexto, e pelo subtexto do subtexto (acabei de ver ontem, por exemplo, uma nota de rodapé a uma nota de rodapé, isto numa crónica sobre o mundo da pornografia) e pelo subtexto do subt... and so on. É muito estranho, não estava habituado a ler coisas assim. A vitória final de Wallace será convencer-me que não devemos cozinhar lagostas vivas, mas essa conclusão ficará para amanhã.