quinta-feira, 9 de outubro de 2008
A questão do casamento
A questão do casamento entre pessoas do mesmo sexo é-me razoavelmente indiferente. Nem acho que estamos a viver uma situação de discriminação, nem acho que a abertura do regime de casamento a homossexuais seja um ataque seja ao que for. Acima de tudo, parece-me absurdo. Não entento porque razão quererão os homossexuais casar - a não ser a questão da adopção, mas pelo que sei não estará vedada ao regime de união de facto e é toda outra conversa - e não percebo onde está a discriminação (este texto do Jorge Miranda faz algum sentido). O casamento é uma figura legal que nasceu com a tradição do reconhecimento da união entre um homem e uma mulher, e que sempre foi protegido por causa da - sim, sim - procriação. A única externalidade positiva que um casamento gera assume a forma da perpetuação da espécie. Pode argumentar-se muita coisa, por exemplo que o casamento já não é o que era e mais não sei quê. Que o casamento está em crise, já todos sabemos, mas ainda não cheguei a esse ponto em que foi decidido resolver a crise do casamento alterando o próprio conceito. Tentar transformar o casamento numa outra coisa para o salvar ou adaptar ao mundo moderno é como emitir mais notas porque as pessoas estão pobres: o efeito pretendido é anulado. Posto isto, se os homossexuais querem poder casar, não vejo absolutamente nenhum incoveniente. Não há razão para que o casamento entre pessoas do mesmo sexo não apresente as mesmas patologias do casamento entre pessoas de sexos opostos, e isto serve para prever uma procura muito diminuta desta variante do casamento. Pode argumentar-se que será uma medida que combaterá a discriminação e o preconceito, atitude que acho louvável, mas julgo que não será eficaz na prossecução desse objectivo. Quem ainda mantém vivos os anti-corpos em relação aos homossexuais, continuará a fazê-lo após a alteração à lei, e eventualmente animará esses mesmos sentimentos. A reputação geral do Estado está tão em baixo que não ajudará à implementação dessa alteração de mentalidades. A discriminação da homossexualidade não nasce de nenhum eventual regime jurídico, nasce de outra coisa qualquer que não desaparecerá tão cedo. É desejável que desapareça? Não me parece sequer haver lugar para essa discussão. Volto ao início: parece-me absurdo que se alargue o conceito (porque é isso que ele é) do casamento à união entre pessoas do mesmo sexo, mas se isso parece ser um assunto tão importante para tanta gente então que se faça. O espaço público político não se pode dar ao luxo de se alongar no tempo sobre estas questões, quando há tanto por discutir. A crise económica, por exemplo, como lembra Žižek.