domingo, 17 de abril de 2005

O elogio do amigo

Muitas vezes ouvi dizer, e corroborei, que os arquitectos se definiam por uma mal-cheirosa rede de amizades mútuas que se auto-promoviam. É verdade, basta olhar para a coincidência de nomes dos júris e vencedores dos principais concursos. Mas adiante. Isto para dizer que, apesar da blogosfera ser completamente inútil no que toca ao capítulo da promoção, é com agrado que parto daqui para uma parcial análise da obra de Ourém, quiçá a obra de arquitectura mais famosa da blogosfera. O que o João tem vindo a fazer é, acho, algo de inédito. A sua série Livro de obra permitiu (digo permitiu porque parece que a obra caminha para o seu apogeu final, com sanca, sim, mas não se pode ter tudo) a todos nós partilhar as angústias, desilusões, vitórias e alegrias do arquitecto enquanto construtor, e não apenas poeta espacial ou teórico de algibeira. Este post é suscitado pela agradável surpresa que tive ao ver (sempre através do blogue) as cores aplicadas na fachada. Depois de ver esquissos, desenhos técnicos, maquetes (inclusivé ao vivo), a coisa finalmente eregida surpreende pela positiva. O preto (aqui acinzentado) sobre o fundo branco acentua a identidade código de barras do edifício. Ficamos, agora, à espera de ver aqueles vãos nus receber a caixilharia e o inevitável vidro, continuando o atribulado caminho da materialização e perseguição da ideia. O Niemeyer diz, em entrevista à Sábado desta semana, que você já pode ter visto melhor e pior do que Brasília, mas igual não viu de certeza e a isso se chama de arquitectura. Desta vez o velho marxista acertou em cheio, e o João de certeza identificará estas palavras com o espírito do mestre, também ele marcado por esse desejo da invenção (falo de Manuel Vicente). Os habitantes de Ourém já viram pior, e, talvez, já tenham visto melhor, mas igual não viram de certeza. E por isso o João já ganhou. Apesar dos honorários abaixo de cão.